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Boletim da Rio+20 Dia 6 A noite virtual

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Sérgio Abranches

O negociador do Brasil, embaixador Luiz Alberto Figueiredo, disse, em breve coletiva à imprensa, que “será uma longa noite” de conversas, mas que as negociações terminam hoje. O resultado será anunciado pelo ministro Antonio Patriota.

O que circula nos corredores é que os negociadores da União Europeia não estão satisfeitos com o ponto a que as conversas chegaram. Figueiredo reconheceu que há pontos que requerem consultas e não desmentiu que a UE queira mais negociação. Indicou que o Brasil pretende mesmo forçar o encerramento das negociações até a madrugada de amanhã. Segundo ele em alguns pontos ainda não se encontrou a fórmula para se chegar ao consenso. Na linguagem típica dos negociadores, procura-se “uma linguagem”, para essas questões que ainda geram controvérsia.

Figueiredo disse também que o texto sobre o PNUMA , o programa ambiental da ONU, fala em “fortalecer e promover”, para que “haja margem para um processo para levar o PNUMA a outro patamar”.  Significa não especificar a que status o programa seria promovido. Essa linguagem, que não constava da formulação inicial, abre a possibilidade de que, nas negociações que se abrirão após a Rio+20, se volte a examinar a proposta de elevar o PNUMA ao status de uma agência especializada. O Brasil é contra essa promoção a agência especializada. Mas o G77/China está dividido: os grupos africano e de pequenos estados-ilha são a favor. A União Europeia é a favor. Os Estados Unidos, contra. Os negociadores buscam uma linguagem que, sem afirmar categoricamente que o PNUMA será promovido a agência especializada, não feche a porta para que essa promoção eventualmente venha a ocorrer.

O chefe do secretariado da Rio+20 Nikhil Seth leu uma declaração do Secretário Geral da Rio+20 em apoio ao esforço negociador do Brasil. Provavelmente como parte da estratégia para pacificar os ânimos, que os rumores pelos corredores da Rio+20 dão como bastante alterados em algumas delegações. Haveria pelo menos uma parte dos delegados insatisfeitos com o texto em negociação, que ameaçam não levar o texto à consideração do segmento de alto nível – ministros e chefes de estado – que começa no dia 20.  Na verdade, basta um veto claro, para impedir que as negociações sejam encerradas. A solução é tentar encontrar uma linguagem que satisfaça aos insatisfeitos, sem provocar reações negativas dos que abram novas linhas de conflito.

Esses ambientes de rumores têm sempre duas causas comuns. A primeira, é a falta de transparência, que reduz de tal modo a informação de fontes oficiais, que estimula a circulação de informações por vias informais. No caso da Rio+20, por exemplo, o fato de as delegações de outros países não promoverem coletivas de imprensa estimula essa busca de fontes informais. Como os delegados são fontes de informação para a imprensa de seus países, a informação sempre flui, mesmo que incompleta e distorcida.

A segunda causa de rumores deriva do processo de negociação. A aceleração forçada do ritmo de negociações, demandas por mais consultas que não são atendidas, terminam por estimular vazamentos de informações, até como recurso de pressão sobre os que coordenam as negociações.

O que está claro é que, no momento, os negociadores brasileiros estão procurando muito mais uma linguagem que acomode os interesses e atenda às objeções de todos, do que um conjunto de ações concretas para o desenvolvimento sustentável. Isso significa cortar parágrafos que não permitem consenso e evitar a introdução de novos parágrafos.

No caso de pressões muito fortes para que o documento contemple determinados pontos, o que os negociadores estão tentando é “encontrar uma linguagem” que permita a incorporação desses temas ao texto. Esse processo troca substância por acordo, linguagem por ações concretas.

A decisão de encerrar as negociações esta noite deve ser entendida no plano de tempo da diplomacia nesses encontros multilaterais. A noite dos diplomatas pode entrar pelo dia das pessoas no mundo real fora do Riocentro. É uma “noite virtual” que aceita acomodações do conceito de “noite”, com o mesmo espírito que procuram acomodar interesses divergentes. A noite virtual vai produzindo um texto tão mais virtual, quanto mais difícil fica conciliar interesses em torno de um texto substantivo. A linguagem se torna difusa, adjetiva e abstrata. As decisões vão sendo adiadas para um tempo futuro, no qual as objeções concretas vão se liquefazendo.


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